domingo, 5 de junho de 2011
Mágoa que magoa...
É uma palavra bonita, mágoa. Sabe a lágrimas silenciosas, a noites de insónia, a manhãs de Domingo solitárias e sem sentido. Está para lá da tristeza, da saudade, do desejo de lutar pelo que já se perdeu, da raiva de não ter o que mais se queria, da pena de ter deixado fugir um grande amor, por ser demasiado grande. Primeiro grita-se, barafusta-se, soluça-se em catadupas. Depois, é o pós-guerra, a rendição, a entrega das armas e as sentenças de um tribunal marcial interior, em que os juízes são a vida, e o réu, o que fizermos dela. Limpam-se os destroços. Enterram-se os mortos, tratam-se dos feridos, que são as nossas feridas, feitas de saudades, de desencontros, palavras infelizes e frases insensatas, medos, frustrações e tudo o que não dissemos. A mágoa chega então, quando o cansaço já não nos deixa sentir mais nada. É silenciosa e matreira, instala-se sem darmos por ela, aloja-se no coração. Mas o mundo nunca pára. Nada pára. A vida foge, os dias atropelam-se, é preciso continuar a vivê-los, mesmo com dor. Pelo menos a mágoa magoa, mas faz-nos sentir vivos.
in As Crónicas da Margarida, Margarida Rebelo Pinto
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